VII CÍRCULO - Rodas de Conversa Bakhtiniana
FRONTEIRAS
Cascavel - PR | UNIOESTE | De 12 a 14/11/2018
EIXOS TEMÁTICOS
Nossas conversas girarão em torno de um tema central: FRONTEIRAS. Você já pode ir escrevendo seu texto, procurando em sua mente, alma e coração seu melhor pensar, suas palavras mais intensas, dialógicas, revolucionárias e bakhtinianas. A partir do tema geral, esmiuçaremos nas arenas e rodas os seguintes eixos:
1. AS FRONTEIRAS ENTRE AS CLASSES SOCIAIS NA SOCIEDADE NEOLIBERAL – FRONTEIRAS ENTRE ESTRUTURA, INFRAESTRUTURA E SUPERESTRUTURA NO CRONOTOPO CONTEMPORÂNEO: ARMAS PARA ABRIR FRONTEIRAS ENTRE AS IDEOLOGIAS DOMINANTES E AS CONTRA-IDEOLOGIAS
O mundo em que vivemos é o mundo do qual fazemos parte – o mundo que constituímos – embora não do nosso agrado, exatamente como gostaríamos que fosse, mas em circunstâncias históricas determinadas. Portanto, temos a nossa parcela de responsabilidade. Como ponto de partida para nosso exame, poderíamos nos perguntar: qual é a fonte ideológica que gera os pressupostos teóricos que alimentam as forças determinantes desta sociedade neoliberal? Trata-se de examinar esta sociedade na ótica do neoliberalismo como categoria de análise. A intenção e o propósito é entender o mundo de fronteiras de hoje – talvez as fronteiras do mundo – fronteiras geográficas, fronteiras marítimas, fronteiras aéreas e espaciais dos estados, países, nações, continentes, hemisférios, blocos... Enfim, as potências mundiais. Uma recomendação sincera: para examinar a questão polêmica, complexa e repleta de contradições – as fronteiras em sua totalidade e individualidade no cenário mundial de hoje – é prudente fazê-lo pelo método dialético de análise de conjuntura. Examinar as conexões entre forças de estrutura (Marx, Gramsci e outros), de infraestrutura (Bakhtin) e de superestrutura. Isso, sem dúvidas, na escala da globalização. Examinar as formas de domínio ideológico, político, científico, tecnológico, domínio do mercado mundial... Também, e principalmente, examinar a missão, o papel social crítico e humanitário, o potencial científico e o poder de transformação das universidades. Buscar os sentidos de fronteiras como fenômeno total. A totalidade das relações, das possibilidades e impossibilidades – fronteiras ideológicas, fronteiras políticas, fronteiras religiosas, fronteiras étnicas, fronteiras fundamentalistas, fronteiras filosóficas, fronteiras éticas, e mil outras.
2. O PODER DA LITERATURA NO APAGAMENTO DAS FRONTEIRAS ENTRE AS LÍNGUAS, AS FRONTEIRAS ENTRE AS LITERATURAS E FRONTEIRAS ENTRE AS CONCEPÇÕES DO MUNDO NA LITERATURA
Examinar a “literatura como universal” à luz de uma perspectiva histórica, “sem distinção de língua e carácter nacional” (Ítalo Calvino), como estética literária na polifonia de vozes dialógicas (M. Bakhtin) e a interpretação na conexão das três intenções nas obras literárias – intentio auctoris, intentio operis e intentio lectoris (U. Eco). Enfim, é preciso exercitar a liberdade interpretativa para superar as fronteiras estruturalistas e formalistas dos limites da interpretação das obras de estética literária. É necessário perceber a interseção da literatura e da ciência. Todo texto científico contém elementos da estética, e todo escrito estético literário contém elementos da ciência. É preciso sentir e vivenciar a multiplicidade polifônica de culturas, ideologias, visões e concepções de mundo, de vida, de soxiedade, de estado, de política, de religiões, etc. É prudente seguir as lições de I. Calvino: “o grande desafio para a literatura é o de saber tecer em conjunto os diversos saberes e os diversos códigos numa visão pluralística e multifacetada do mundo”. E as lições de M. Bakhtin, para romper com o “domínio da cultura e da estética burguesas dos tempos modernos”. Em contraposição, Bakhtin adverte que para compreender é preciso “... a reformulação radical de todas as concepções artísticas e ideológicas, a capacidade de desfazer-se de muitas exigências do gosto literário profundamente arraigadas, a revisão de uma infinidade de noções e sobretudo, uma investigação profunda dos domínios da literatura cômica popular que tem sido tão pouco e tão superficialmente explorada”. E de U. Eco aprendemos mais: “a imaginação narrativa não tem limites”. E não tem fronteiras, com certeza. Pois, “[...] texto algum pode ser interpretado segundo a utopia de um sentido autorizado fixo, original e definitivo. A linguagem sempre diz algo mais do que seu inacessível sentido literal, o qual já se perdeu a partir do início da emissão textual”. Realmente, a literatura é um espaço e um tempo sem fronteiras. No universo infinito da literatura sempre se abrem outros caminhos a explorar, novíssimos ou bem antigos, estilos e formas que podem mudar nossa imagem do mundo [...] Mas se a literatura não basta para me assegurar que não estou apenas perseguindo sonhos, então busco na ciência alimento para as minhas visões das quais todo pesadume tenha sido excluído” (I. Calvino).
3. AS FRONTEIRAS ABERTAS/POSSÍVEIS ENTRE A TEORIA BAKHTINIANA E O ENSINO DA LÍNGUA E LITERATURA: RETRATAR E REFLETIR
Ao examinar as densas e consistentes discussões teóricas de língua e literatura – categorias de análise, conceitos-chave inéditos, palavras prenhes de ideologia, de sentidos históricos sem fronteiras do pensamento – que Bakhtin escreveu, é preciso examinar o fazer pedagógico de Bakhtin na condição de professor que foi, durante vários anos, em colégio de ensino médio, no fervor do estado socialista soviético, nos anos da segunda guerra mundial. No fazer pedagógico em sala de aula, Bakhtin se dedicou a estimular os alunos adolescentes a desenvolverem “o gosto e o amor” à estética literária e ao vivenciamento estético da língua viva. Assim, Bakhtin foi um professor apaixonado pelo ato didático-pedagógico em sala de aula - além, é claro, de apaixonado pelas conversas e pelos escritos ousados e inéditos sobre a língua viva, falada e escrita, ao ponto de “vencer o tédio e a esterilidade […] do ensino tradicional de gramática. E faz isso por meio de um procedimento metodológico ativo, flexível e cuidadoso: vai elaborando passo a passo, sempre junto com os alunos, a percepção e a compreensão dos efeitos de sentido de uma construção sintática. Não há grandes preocupações terminológicas ou conceituais, mas um caminhar que vai provocando a intuição e a reflexão dos alunos. A meta é conseguir que cada um alcance plena autonomia e individualidade linguística, livre da linguagem artificial, impessoal, livresca”. Quem escreveu essas afirmações verdadeiras em nível elevado sobre Bakhtin foi Carlos Alberto Faraco, um estudioso de Bakhtin na UFPR (orelha do livro: Mikahil Bakhtin – Questões de estilística no ensino da Língua. São Paulo: Editora 34, 2013). Assim, fica aqui o convite para romper de vez, expurgar, higienizar a pedagogia escolasticista nas escolas e universidades, ainda sob o império dos formalismos e estruturalismos abstracionistas – posturas conceituais e métodos mnemônicos nos processo de ensino. Com o uso e a aplicação de categorias, conceitos e noções originados diretamente do pensamento bakhtiniano, nas salas de aula – ética, estética, diálogo, dialogismo, polifonia, palavra, ato, atividade, riso, dentre muitas outras categorias – é possível superar, de vez, as fronteiras e os limites nos métodos atuais de ensino-aprendizagem do “apreender”, momento restrito ao exercício da memória. É preciso ir além do apreender e atingir o “compreender” os sentidos e os significados das palavras, dos signos, dos fatos e acontecimentos da história e das noções das ciências. Com o domínio destes dois processos é preciso atingir a escala da “interpretação”, momento da criatividade, da originalidade, da inventividade pela “pedagogia da imaginação” (acepção de I. Calvino). Com estes três processos chega-se à escala da quebra de paradigmas pela criticidade, pela problematização e pelo saber fazer as perguntas antes de saber dar as respostas às perguntas já formuladas e repetidas à exaustão nos livros didáticos, nos conteúdos dos planos de ensino.
4. AS FRONTEIRAS ENTRE OS CONCEITOS TEÓRICOS E O MUNDO REAL: ENTRE AS SALAS DE AULA E OS LIVROS
Aqui pretende-se examinar as fronteiras entre as teorias e as realidades, entre a linguagem do mundo real, material não-escrito e a linguagem do mundo escrito, nem sempre real, mas inventado segundo a lógica ideológica e os interesses das elites das classes dominadoras. O Felipe, menino de oito anos, aluno do 4º ano do ensino fundamental, leu os 12 Volumes de “Diário de um Banana” – Jeff Kinney – em dois meses, no total de 2.240 páginas. Uma leitura visual de texto impresso em papel – livro – portanto, não foi uma leitura de escuta auditiva, nem uma leitura virtual de tela eletrônica. Neste tempo, o Felipe frequentou o colégio, está escrevendo o diário “A Saga do Felipe”, título que ele mesmo inventou, brinca com amiguinhos e amiguinhas no condomínio onde mora, desenha e pinta inúmeros quadros, e se diverte com jogos online no celular. Todas e todos coleguinhas da sala do Felipe estão lendo visualmente o “Diário de um Banana”, conversam, comentam e inventam muitas histórias, interagem e compartilham muito as interpretações segundo a imaginação de cada uma e cada um. É claro, motivados, estimulados, animados pela professora. Todas e todos tem e usam celulares. Aí fica a pergunta: a leitura visual de textos escritos – livros, gibis, revistas – está em plena, cabal e irreversível extinção? A “pedagogia da imaginação”, proposta por I. Calvino, está viva, hoje, no mundo criativo das crianças, ou estaria sendo devorada pela fantasia e ilusão do mundo do WhatsApp? O império sedutor das maquinarias eletrônicas estaria aniquilando a imaginação, a criatividade e a vivência da estética na literatura, nas artes – pintura, música, dança – e nas brincadeiras corporais – parquinhos, playgrouds, esportes, jogos – das crianças durante 24 horas por dia, durante semanas, meses, anos inteiros? Aí, sim, precisamos examinar o mundo da imaginação e o mundo da imagem, o mundo escrito e o mundo não-escrito, o império do “príncipe eletrônico” e a leitura visual dos livros impressos, enfim examinar o Texto em Sala de Aula e a escrita de histórias de vida e do mundo da imaginação das crianças, dos adolescentes e dos jovens em salas de aula. Aí, sim, ler Bakhtin é vida, é ato responsivo de todos e de todas. Com Bakhtin, Calvino, Eco, e todos e todas que escreveram e continuam escrevendo o mundo-real e ficcional na estética da literatura local, nacional e universal sem fronteiras de línguas, de linguagens, de ideologias, de religiões, de pensamento, de filosofia... então para que persistir com teorias estruturalistas, formalistas, abstracionistas nas salas universitárias? Há estudos científicos psicológicos, psiquiátricos, psicanalíticos, biológicos à exaustão, e todos apontando e alertando sobre os efeitos atrofiadores dos cérebros humanos pelo excesso e uso descontrolado sem limites da maquinaria eletrônica pelas nossas crianças, nossos adolescentes, jovens, adultos, velhos...É urgente examinar os benefícios e os malefícios do império da maquinaria eletrônica. É a sociedade dividida ao meio: o lado bom e o seu oposto lado dos malefícios. Aliás, é necessário ver as contradições em tudo. Estas fronteiras só são possíveis de examinar pelo método dialético.